Lenny precipitou-se pelas longas escadarias até chegar ao Salão Nobre. Por sorte, os degraus pareciam ter adormecido e não mudaram de sítio, o que fez com que Lenny chegasse ao seu destino num ápice. Abriu as portas do Salão Nobre com um estrondo e olhou para todos os lados.
Vários alunos falavam agitadamente sentados às longas mesas, mas não havia sinais de Draco ou do pai. McGonagall também não se encontrava à mesa dos professores. Lenny dirigiu-se à mesa dos Slytherin apressadamente e podia sentir os olhos de todos cravados em si.
-O Draco? - perguntou ela, sem rodeios, fixando Pansy.
-Saiu com o pai - respondeu por sua vez Daphne - a McGonagall foi com eles para se assegurar que não acontecia nada. Tu estás bem?
-Estou preocupada com o Draco - afirmou Lenny, novamente sem rodeios. Os Slytherin eram muito diferentes dos seus amigos Gryffindor naquele aspeto: também eles, ao contrário das restantes casas de Hogwarts, se preocupavam com Draco. Gostavam dele.
-Nós também - Daphne acenou com a cabeça, juntamente com os outros.
-Como se tu te preocupasses com ele. Fugiste daqui a sete pés! - cuspiu Pansy. Lenny preparava-se para lhe responder quando Daphne interrompeu:
-A Lenny foi arrastada daqui para sua segurança, Pansy! Via-se perfeitamente nos olhos dela que só tinha uma coisa em mente: o Draco – depois olhou para Lenny - distinguia-se uma grande preocupação no teu olhar quando abandonaste o salão. Mas a diretora está com eles e o pai do Draco não se atreve a dizer nem fazer nada ao filho na presença dela. Provavelmente estão no escritório da McGonagall.
Aquilo não a descansou. Só quando visse Draco, são e salvo, Lenny poderia suspirar de alívio. A voz do professor Slughorn fez-se soar.
-Muito bem, alunos. Devido aos últimos acontecimentos, quero que os Chefes de Equipa levem os seus colegas às respetivas salas Comuns. Entendido?
Lenny viu Harry, Ron, Hermione, Ginny e os gémeos Weasley a chegarem ao salão e a serem de imediato engolidos pela multidão de Gryffindors que saía do Salão.
-Anda - disse Daphne, dando um puxão na capa de Lenny. Esta acedeu, derrotada. Dirigiram-se em silêncio para os calabouços, onde entraram na sala comum.
*
As horas pareciam arrastar-se eternamente. Alguns dos Slytherin resolveram ir deitar-se, outros conversavam sobre Draco, Lenny, Lucius, etc, na sala comum, outros jogavam xadrez distraidamente. Lenny, sem nada para fazer, visto que Draco ainda não regressara, tentara abstrair-se de todas as preocupações lavando os dentes, lendo ou fazendo os trabalhos de casa, mas nada disso a ajudou. Continuava aflitíssima e nervosa. Por vezes ouvia o seu nome a meio de uma conversa, mas não se importava.
Passava agora das onze horas da noite, mas ainda bastantes Slytherin se encontravam na sala, quando Daphne foi ter com ela. Sentou-se no sofá verde-esmeralda à sua frente.
-Não te preocupes, Lenny. Porque não te vais deitar? Amanhã já vais poder falar com o Draco.
-Não vou conseguir dormir, Daphne. Eu agradeço a tua preocupação, mas... não consigo.
-Eu compreendo - Daphne afastou uma madeixa de cabelo louro dos olhos. Depois baixou a voz - e também te queria dizer que não ligasses ao comportamento da Pansy.
-Isso é o que menos me preocupa agora - assegurou Lenny. De repente, a porta da sala comum dos Slytherin abriu-se e um Draco cansado e preocupado emergiu. Lenny ficou num tal estado de choque que não se conseguiu mover. Os olhos de Draco vaguearam pela sala claramente à procura de alguém: a sua expressão aliviou-se um pouco ao ver Lenny.
-Draco! - exclamou Pansy - como estás?
-Que disse o teu pai? - perguntou outro Slytherin. A sala encheu-se de perguntas, mas Draco manteve-se calado. Depois pigarreou.
-Hum, pessoal... se não se importassem, eu gostava de... falar com a... Lenny... a sós - pediu.
-Com a Lenny? - interrogou Pansy, irritada - porquê?
Draco suspirou e olhou-a como que a dizer "oh, não sei, talvez porque o meu pai esteve a um passo de a atacar...". Daphne agarrou no braço de Pansy e arrastou-a em direção aos dormitórios femininos. Os outros Slytherin apressaram-se a esvaziar a sala: compreendiam que eles precisavam de um momento sozinhos. Após o último aluno ter fechado a porta do dormitório, Lenny levantou-se. Ambos deram um passo em frente, automaticamente.
-Estás bem? - perguntaram em uníssono. Soltaram ambos uma gargalhada rouca. O alívio era visível nas suas vozes.
-Primeiro as senhoras - disse Draco. Aquilo não era mesmo nada dele. Draco Malfoy a comportar-se como um cavalheiro? Era como Voldemort não querer aniquilar Harry. Lenny não pôde deixar de se questionar sobre o que diriam os seus amigos Gryffindor se o vissem a comportar-se de maneira tão diferente da forma como o pintavam.
-Eu estou bem, apenas preocupada... contigo. E tu?
-Eu também estou bem. Espanta-me é que estejas preocupada comigo. Eu é que deveria estar preocupado contigo - Draco adquirira uma expressão dura.
-E não estás? - questionou Lenny, hesitante.
-Claro que estou! - Draco deu mais um passo em frente - lamento ter-te posto em perigo... sabe-se lá o que é que o meu pai iria fazer!
-Estás a dizer que não me sei defender? - Lenny falou sem pensar. Draco esboçou um meio sorriso.
-Claro que não - depois voltou a ficar sério - mas não me perdoo... podia ter-te acontecido alguma coisa... eu nunca me perdoaria...
-Draco! - exclamou Lenny - tu não tens culpa de nada! Não és responsável pelo que o teu pai faz ou deixa de fazer, mete isso na tua cabeça. E tu evitaste-o, Draco. Salvaste-me.
Draco abanou a cabeça.
-Mas...
-Eu também estava preocupada contigo, sabes? - interveio Lenny - pensei que o teu pai te pudesse proibir de me ver... te pudesse fazer sair de Hogwarts... que te desse um sermão enorme...
-Podes ficar descansada, isso não aconteceu. Quer dizer, ele tentou não fazer-me demasiadas perguntas, já que a McGonagall se recusou a sair de junto de nós. Por isso, não me azucrinou a cabeça nem fez qualquer ameaça. E além disso, não me chegou a falar daquilo que me queria dizer antes de te ver. Calculo que seria algo privado e não se atreveu a contar-me em frente à diretora. Mas continuo a pensar no que te poderia ter acontecido...
-Chega, Draco! - afirmou Lenny em tom firme - não me aconteceu nada. Agora espanta-me é que não tenhas pensado que estava preocupada contigo. Quer dizer, tu tens noção da influência que exerces sobre mim, por isso...
-Tenho? - Draco exibia agora aquele brilho no olhar e aquele sorriso sarcástico típico dele. A rapariga revirou os olhos.
-Tu foste a causa de eu ter ido para os Slytherin, se bem te lembras.
-Já não tenho tanta certeza disso. Quer dizer, agora sei que tens as qualidades que Salazar Slytherin apreciava nos seus alunos: és determinada e ambiciosa, tens claramente um certo desprezo pelas regras e até tens uma pontinha de inteligência.
Lenny revirou os olhos novamente, não conseguindo evitar um sorriso.
-Sim, mas... tirando a aparência... sempre pensei que não era aos Slytherin que pertencia. Quer dizer, nós temos uma má reputação – explicou ela.
-Não percebes, Lenny? Tu já contrariaste esse facto. Quando o Chapéu te pôs nos Slytherin, tu provaste que não eram só os feiticeiros do Mal que vinham para cá.
-Como sabes que não sou má? - ripostou Lenny.
-Nota-se. Exceto a tua bela aparência rebelde, não há nada em ti que te faça parecer má. E tu sabes que não precisamos de ser maus. Eu acho que sim, que talvez eu te tenha influenciado um pouco a vir para aqui, mas que, no fundo, quando o Chapéu Selecionador disse que o teu coração já se tinha decido há muito, ele referia-se também às tuas qualidades. Quase que apostava.
-Achas mesmo? - perguntou Lenny, sorrindo. Sentia-se, pela primeira vez desde que vira Lucius, completamente feliz.
-Acho - Draco sorriu também - até és inteligente quando queres.
-Não estava a referir-me a isso - e Lenny exibiu um sorriso sarcástico - achas mesmo que tenho uma bela aparência?
Draco enrubesceu. Por certo não se apercebera que a elogiara daquela maneira. Mas se era a verdade... por que não dizer-lha?
-Bom, como se tu não soubesses isso - o rapaz revirou os olhos e adotou a sua típica postura de "estou-me nas tintas...".
-Que queres dizer?
-Quero dizer que como se tu não reparasses nos olhares que os rapazes da escola te mandam. Ainda me lembro quando o Fred Weasley assobiou no primeiro banquete do ano letivo - então fora Fred que assobiara... e seria verdade que os rapazes a observavam? Era verdade que olhavam para ela, mas Lenny sempre atribuíra esse facto à sua história e aos seus pais. Draco voltou a insistir: – como se tu não soubesses que é por essa razão que a Pansy não vai com a tua cara.
-Oh, a Pansy não liga a isso! – argumentou Lenny.
-Faz que não liga, mas todas as raparigas ligam, não é? Tu és bonita e simpática, todos gostam de ti e ela inveja-te.
Então, Lenny falou sem pensar:
-Sempre pensei que fosse porque eu gosto de ti e por ela também gostar – em seguida, corou e desviou o olhar. Draco sorriu e encolheu os ombros.
-Isso também.
-Convencido – replicou a rapariga.
-Convencido não, apenas realista – contrapôs o rapaz. Bolas, aquilo era ter química! Estavam definitivamente a namoriscar, a, como apelidavam as raparigas Muggles com quem convivera ao longo dos anos nas escolas de Muggles, “ter um momento”.
-Estás outra vez em vantagem – notou Lenny – sabes que eu gosto de ti, mas eu não sei se os sentimentos são mútuos.
Draco desviou o olhar e mordeu o lábio inferior.
-Não sabes mesmo? – e dito isto, Draco aproximou-se dela e olhou-a fixamente. Os seus olhos azuis-acinzentados gélidos-mas-calorosos viam através dela, como se lhe lessem a alma. O rapaz pegou-lhe na face com as mãos frias e inclinou-se sobre ela. O coração de ambos batia desenfreadamente. Num movimento mecânico, Lenny rodeou o pescoço de Draco com os braços e fechou os olhos, enquanto os lábios suaves e apetitosos de Draco se tocavam nos seus. Primeiro, suavemente, depois, vendo que Lenny correspondia ao beijo, beijou-a intensamente. O seu hálito sabia a hortelã-pimenta, algo que Lenny adorava. As mãos de Draco deslizaram atrevidamente da cabeça dela até à sua cintura e ele puxou-a para si.
Lenny sentia-se nas nuvens. Sentia um nervosismo enorme e muito calor, mas acima de tudo, sentia-se segura e protegida com Draco, aninhada no seu porto seguro. Além disso, aquele tinha sido o primeiro beijo de Lenny, mas ela não lho diria. E fora mágico. Draco era realmente incrível e Lenny estava profundamente envolvida na sua auréola misteriosa.
Afastaram-se um pouco para recuperar o fôlego. Draco continuava a segurar-lhe a cintura e a apertá-la contra si, como se quisesse afirmar que ela era dele, que pertenciam um ao outro.
-Acho que isto responde à tua pergunta – proferiu ele, divertidamente – desde o primeiro momento em que te vi, sabes? Antes de embarcarmos nos barcos para vir para Hogwarts. Devias ter visto a minha cara de atarantado quando me virei para seguir em frente. Fiquei todo atrapalhado. Não era apenas por seres a Lenny Gant, mas por seres tão… bonita e diferente. Especial. E depois comecei a conhecer-te realmente e isso só fez com que gostasse ainda mais de ti. Como já te disse, aqueles dias que passei a ignorar-te foram horríveis. Nunca pensei que alguém me pudesse fazer isto, sabes? Exercer tanta influência sobre mim, pôr-me tão louco como tu me pões…
Lenny assentiu afirmativamente com a cabeça e mordeu o lábio inferior. Sabia exatamente o que Draco queria dizer. Ela sentia o mesmo. E, como verdadeiras almas-gêmeas, declaram ao mesmo tempo:
-Seres a minha força e a minha fraqueza ao mesmo tempo.
-Sim – completou Lenny – sei exatamente o que isso é.
Draco sorriu. A pouco e pouco, o seu escudo, que o impedia de ser carinhoso, aquilo que o protegia de se magoar e o fazia parecer sempre tão frio e gélido, ia rachando e Lenny tinha sido a única pessoa em todo o Universo a conseguir quebrá-lo. Lenny também não era lá muito calorosa, por isso passava-se o mesmo. O facto de serem tão semelhantes e tão diferentes ao mesmo tempo, o facto de serem a força e a fraqueza do outro ao mesmo tempo fazia com que… se amassem profundamente. Não era um simples amor adolescente, como Fred e George tinham afirmado, era muito mais do que isso. Um amor verdadeiro e uma amizade infinita, proteção e segurança que nutriam um pelo outro.
-Amo-te – disse Draco sem qualquer dificuldade. O quanto lhe era difícil admitir e interiorizar aquilo e o quanto tinha sido fácil dizê-lo…
-Eu também te amo – concordou Lenny.
-Não vou deixar que ninguém te faça mal. E não quero saber do meu pai. Só quero estar contigo. És o centro do meu mundo – confessou ele, honestamente.
Lenny sentiu os olhos húmidos e puxou Draco mais para si. Voltaram a beijar-se, quando Daphne os interrompeu.
-Ups, des-desculpem! – gaguejou ela, nervosa – só vinha buscar um livro de que me esqueci...
Lenny nunca vira Daphne tão atrapalhada. Parecia sempre tão segura de si. A rapariga agarrou rapidamente num livro de capa cinzenta que se encontrava numa mesa ali perto e apressou-se a sair, mas Lenny viu que ela lhe piscava discretamente o olho, embora ainda estivesse um pouco atarantada. Lenny gostava de Daphne. Apesar de ser amiga de Pansy, não eram muito parecidas.
-Não lhe ligues – sussurrou Draco ao ouvido de Lenny – ela fica sempre assim quando interrompe alguém em momentos destes.
-Ela é simpática – Lenny encolheu os ombros. Draco roçou o seu nariz no dela.
-É. Mas tu também – Draco voltou a murmurar-lhe ao ouvido, com uma voz incaracteristicamente doce: – e és minha.
E Lenny agarrou Draco pelos colarinhos, beijou-o ferozmente e caíram os dois com estrondo e aos risinhos, num dos sofás verde-esmeralda da sala comum dos Slytherin, que era agora muito mais do que apenas isso: era a sala onde tinham partilhado o primeiro beijo, onde tinham declarado o seu amor um pelo outro.
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