segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Conflitos

-Tu – a voz dele era fria e cortante, e recheada de desprezo. Lenny engoliu em seco e sentiu o coração a bater mais depressa.
-Pai – ouviu Draco dizer, aproximando-se deles. Lenny encontrava-se no meio deles, mas naquele momento só lhe apetecia sair dali. Era como os Muggles diziam “O que é bom acaba depressa”. Lenny sentira-se feliz pelo retorno dos pais, e claro que ainda estava imensamente feliz por isso, mas essa felicidade fora posta de lado desde o momento em que ouvira Draco falar acerca dos pais deles. E agora estava frente a frente com Lucius Malfoy.  
-Não. Consigo. Acreditar. Que Foste. Com. Esta. Rapariga. Procurar. Os. Pais. Estúpidos. E. Imundos. Dela – Lucius rangeu os dentes e falou lentamente, mas no segundo seguinte tinha uma varinha de madeira de cerejeira, tamanho de 25 centímetros, pouco flexível, apontada à cara.
-Retire o que disse. Já – exigiu Lenny, sem se preocupar minimamente pelo facto de estar a ameaçar o pai do rapaz que amava. Em sua defesa, ele acabara de insultar os seus pais!
Lucius esboçou um sorriso sarcástico e escarninho.
-E porque haveria?
-Pai, deixa a Lenny de lado. Se me queres dizer alguma coisa, diz-me a mim – pediu Draco. No momento em que os olhos de Lucius incidiram no filho ficaram brilhantes de fúria.
-Tens muito que explicar, meu menino – afirmou, como se estivesse a falar para uma criança pequena. Lenny continuava de varinha apontada à sua cara, mas Lucius parecia não se importar.
-Então, deixa a Lenny ir-se embora - repetiu Draco.
-Porquê, ela é covarde? – inquiriu Lucius, os olhos de novo fixos em Lenny. O seu sorriso maquiavélico voltou a tomar-lhe o rosto.
-Não fui eu que abandonei a guerra assim que Voldemort foi destruído – acusou Lenny, com rancor. Ela não queria dizer aquilo para magoar Draco, mas ao mesmo tempo queria dizê-lo por amor e lealdade aos pais e por raiva a Lucius.
-Pois, tu nem sequer apareceste – ripostou Lucius.
-Mais vale tarde que nunca – disse Lenny, a varinha firmemente segura na sua mão.
-Já chega! – exclamou Draco. Lenny sabia que apenas Pansy, Gregory e Vincent estavam na sala comum além deles, mas nenhum deles parecia estar lá, pois não se ouviam.
-Sim, concordo – alegou Lenny, baixando a varinha – já perdi demasiado tempo – e passou por Lucius, saindo das masmorras. Não sabia o que se passava; porque não ficara para defender e ajudar Draco. Mas talvez este não precisasse ou não quisesse ajuda e Lenny não se devia meter entre pai e filho. “Ele tem a Pansy para o defender, se quiser”, pensou ela, amargurada.
Lenny pensou ir até às margens do Lago Negro para pensar e espairecer, porém não o pôde fazer pois avistou o pai a falar com o professor Braxton. Lenny arregalou os olhos… quando fora a Hogsmeade, o amigo de infância dos pais, Carl Jonathan, dissera-lhe que o pai até se dava com Braxton… mas Lenny nunca esperara encontrar os dois a conversar…  afinal, Braxton fora um Slytherin e o pai era um Gryffindor... e no entanto ali estava a prova, mesmo à sua frente. Vários outros alunos olhavam também para eles, espantados. Lenny não queria nada ir ter com eles; apesar de ser dos Slytherin, Braxton ainda a intimidava um bocado. Por sorte, o seu pai e o professor despediram-se um do outro pouco tempo depois, Braxton subindo a escadaria da entrada e Michael indo ter com Lenny.
-Então és amigo do Braxton – afirmou Lenny.
-É um exemplo de um bom Slytherin - respondeu o pai.
-Os Slytherins também sabem ser corajosos e bons – defendeu Lenny. Michael sorriu-lhe.
-Eu sei. Então, já conversaste com todos os teus amigos?
-Sim. Onde está a mãe?
-Foi com a tua avó avisar a diretora que vamos a Hogsmeade. Queres vir connosco? Vamos daqui a pouco.
A recordação da bonita Anastacia, meia veela, filha de Carl, trespassou-lhe a mente.
-Não… mas diz ao Carl que mando cumprimentos – na menção de Carl, Lenny lembrou-se de outra coisa. Deitou a mãe ao bolso do manto e retirou de lá o colar que Carl lhe dera em Hogsmeade, um com uma ampulheta com areia laranja e roxa – ele deu-me isto quando lá fui… disse-me que a mãe lhe dera isto para me dar a mim. Mas não sei o que é ou para que serve.
Michael abriu a boca para responder, mas foi interrompido por uma voz já familiar a Lenny.
-Ora, ora… olha quem aqui está – Lenny virou-se para ver Lucius encará-los, com Draco ao lado e uma senhora de cabelo branco e preto e olhos pretos ao lado. Lenny calculou que fosse Narcissa Malfoy, a mãe de Draco. Parecia ser um pouco mais amável que Lucius, uma vez que salvara Harry ao dizer a Voldemort que este estava morto na Floresta Proibida durante a batalha de Hogwarts, mas também, com a sua posse altiva, não era pessoa de faltar ao respeito.

Narcissa Malfoy

-Lucius – cumprimentou Michael, com voz enfadonha e avançando um passo para ficar lado a lado com a filha. Os olhos de Draco observaram-no durante um momento e depois fixaram-se nos de Lenny. A sua expressão era indescritível.
-Aposto que não ficaste muito contente ao perceber que a tua querida filha, após tanto tempo sendo cepa-torta, fosse entrar nos Slytherin – sorriu Lucius e Lenny cerrou os punhos. Como podia Draco não se ter comportado de forma tão arrogante e má nos últimos anos se o único exemplo que tinha era o seu pai, este tão maléfico e frio?
Vários alunos estavam novamente a olhar para aquela cena. Uns cochichavam, outros arregalavam os olhos e alguns deles tinham as mãos nos mantos, como se estivessem prontos a sacar das suas varinhas a qualquer momento, caso houvesse uma luta e as coisas dessem para o torto.
-E eu aposto em como não conseguiste suportar o facto de a minha querida filha ultrapassar o teu querido filho em quase todas as disciplinas – argumentou Michael e Lenny sentiu-se sufocar. Isso não era bem verdade… Draco era definitivamente melhor que ela a Poções e a todas as disciplinas teóricas… além de voar melhor…
-E como é que sabes isso se só estás com ela há poucos dias desde que misteriosamente ganhou poderes? – contrapôs Lucius.
-A diretora contou-me – retorquiu Michael e Lenny não tinha a certeza se era boa ideia mencionar o nome de Minerva McGonagall naquelas circunstâncias, nem se era realmente verdade o que o pai dizia.
-Boa desculpa – riu Lucius e depois olhou para Draco – mas ainda não consegui perceber como é que o meu filho foi com a vossa filha, aquele irritante do Potter, uma sangue de lama e os pobres dos Weasleys procurar-vos…
Lenny cerrou os dentes. Ele não tinha o direito de falar assim dos seus amigos!
-Eu também não compreendo isso, mas prefiro que respeites os amigos da minha filha – Michael semicerrou os olhos, fixando-os em Draco. Lenny sentiu um arrepio na espinha à medida que tanto o pai, como Lucius e Narcissa olhavam ora para Lenny ora para Draco.
-A tua filha decidiu levar um colega Slytherin para lhe fazer companhia, foi? – desdenhou Lucius e Lenny odiou a forma como Lucius falava dela como se ela não estivesse ali. Não podia ele perguntar-lhe diretamente a ela?
-Se assim fosse teria levado um melhor, não é? – irritou-se Michael. Com este comentário, Draco desviou os olhos dos de Lenny e esta não precisou de Legilimância para perceber o que Draco estava a pensar… “sabia que não te merecia, Lenny, que eras melhor do que eu valia…”.
-Como te atreves…? – enfureceu-se Lucius, mas Narcissa agarrou-lhe no manto, sussurrando-lhe algo ao ouvido.
-Diz-me que não é verdade, Lucius... sendo filho de um sacana como tu… - continuou Michael.
-Pai! – gritou Lenny, não querendo saber da figura que podia estar a fazer em frente aos seus colegas. Porque estava o pai a falar assim para Lucius? E a falar assim de Draco? Sabia que era assim que a maioria das pessoas da escola pensava, menos os Slytherin, mas… doía-lhe saber que era assim que o pai pensava de Draco.
-Que é? – questionou ele, olhando brevemente para a filha. Lenny hesitou. Agora era o momento certo de dizer a ambas as famílias o que Lenny e Draco sentiam um pelo outro… mas não conseguiu. Nem Draco. Em vez disso, optou pela via mais fiável.
-Estás a fazer uma cena em frente a toda a gente! – murmurou ela – para com isso, parecem dois adolescentes às turras.
Michael suspirou.
-Está bem, mas porque não podem simplesmente explicar porque é que ele foi contigo procurar-nos?
Lenny não sabia como os seus pais e os pais de Draco ainda não tinham percebido a verdade ou como ainda ninguém lhes tinha dito nada e isso deixava-a enervada e nervosa, mas queria dizer a verdade num local sossegado e não com um montão de gente a assistir como se fosse um filme.
-Fui com ela porque… - disse Draco antes que Lenny pudesse responder e todos os olhares se cravaram nele – porque não tive escolha.
Lenny sentiu um baque no coração. De que raio estava ele a falar? Estaria ele a mentir para os encobrir ou estaria mesmo a confessar o que lhe ia na cabeça? E se fosse esse o caso… Draco afirmara que tinham ido todos porque queriam, por isso que estava ele a dizer?
-Não tive escolha porque… - Draco olhou para Lenny e rapidamente desviou o olhar – porque, cusco como sou, vi a Lenny e os outros a embrenharem-se na Florestas Proibida e fui atrás deles. Depois uns pássaros atacaram-nos e eu já não pude voltar para trás.
Não era a desculpa mais credível de sempre e Lenny não sabia se coincidia ou não com a versão que os gémeos haviam dito a toda a gente, mas quem conhecesse Draco minimamente sabia que ele era pessoa para incomodar os outros. De qualquer forma, os gémeos provavelmente só começaram a contar a jornada a partir da altura em que se encontravam na Floresta, o que fazia os factos coincidirem.
-E pronto, é tudo - finalizou.
-Porque não disseram antes? – grunhiu Lucius.
-Não nos deram oportunidade! – exclamou Lenny, rezando para que ninguém tivesse a excelente ideia de os denunciar e de dizer que a única razão porque Draco fora com Lenny era porque gostavam um do outro – estão constantemente a implicar!
Passado algum tempo de silêncio, Michael assentiu levemente com a cabeça.
-Está bem, então – suspirou ele, lançando um último olhar à família Malfoy e perfurando entre a multidão. Lenny não se atreveu a olhar Draco uma última vez e apressou-se a seguir o pai antes que alguém os pudesse denunciar ou provocasse mais conflitos. 

domingo, 22 de dezembro de 2013

Queda

Lenny encontrou Harry, Hermione, Ron, Ginny, Fred e George no átrio principal, rodeados de alguns Gryffindors, entre eles Neville, e Luna, dos Ravenclaw. Lenny tinha acordado às três da tarde e agora passava pouco tempo das quatro. O clima estava frio, mas não chovia.
-Lenny! – exclamaram Neville e Luna.
-Olá – sorriu ela, contente por vê-los.
-Não acredito que não nos incluíram na vossa aventura – disse Luna, mas não parecia verdadeiramente chateada, apenas… aborrecida. Lenny sentiu-se embaraçada.
-Não queríamos prejudicar mais ninguém – socorreu Hermione – e foi um bocado difícil esconder o plano do Fred e do George, pelo que tivemos de incluí-los.
Fred e George fizeram cara de ofendidos, mas estavam apenas a brincar.
-Desculpem – lamentou-se Lenny.
-Não faz mal. Nós compreendemos – tranquilizou Neville com um sorriso verdadeiro.
Lenny avistou Daphne não muito longe dali, acompanhada de Adrian Pucey, Blaise Zabini e Millicent Bulstrode. Depois de falar mais um pouco sobre a sua jornada com os seus amigos Gryffindor e Luna, foi ter com os seus colegas Slytherin.
-Lenny! – cumprimentaram eles.
-Que jornada que tiveste, hem? – sorriu Adrian.
-Estás melhor? – perguntou Daphne.
-Sim, obrigada. E desculpa por te ter encarregado de tratares da Hedz e do Shy – disse Lenny.
-Não faz mal – sorriu Daphne – até foi divertido.
-Sabem onde está o Draco? Ainda não o vi desde que acordei – alegou Lenny.
-A última vez que o vimos estava junto da Pansy, do Gregory e do Vincent – referiu Blaise. Lenny não conseguiu evitar sentir-se desapontada. Já tinha corrido por toda a escola que Lenny acordara. A novidade ainda não teria chegado aos ouvidos de Draco ou não se importaria ele o suficiente para a ir procurar? Lenny abanou a cabeça. Depois de tudo o que ele fizera por Lenny, esta não podia deixar as suas inseguranças vencer.
-Obrigada – agradeceu Lenny - vou procurá-lo. Se o virem digam-lhe que ando à procura dele.
-O Shy e a Hedz estão no dormitório, Lenny – informou Daphne, quando Lenny se afastou.
Lenny adorava estar de novo em Hogwarts, a sua segunda casa, a conviver com os amigos, mas sentia-se insegura relativamente à atitude de Draco. Como ele não estava na sala comum dos Slytherin, Lenny aproveitou para ver Hedz e Shy, cada um cuidadosamente tratados e empoleirados nas suas gaiolas, junto à janela do dormitório onde Lenny, Daphne e mais três raparigas dormiam. Hedz beliscou-lhe os dedos, castigando-a por se ter ido embora e Shy rebolou pelo seu ombro, as bochechinhas a ficarem vermelhas. Lenny fez-lhes festas e alimentou-os. Constatou que os pertences que estavam na sua mala que levara pela jornada estavam arrumados. Pegou na sua varinha e quando estava a sair do dormitório ouviu a voz de Draco, provocando-lhe um aperto no coração.
-Espero que esteja bem.
-Não a vais ver, Draco? – indagou outra voz, que Lenny reconheceu como pertencendo a Pansy.
-Já te disse que não posso – afirmou Draco e Lenny franziu o sobrolho – não enquanto os pais dela e os meus estiverem por perto.
Lenny engoliu em seco. Os pais de Draco estavam em Hogwarts? Se bem que era natural, depois de tudo o que acontecera… sabia que Molly e Arthur Weasley também tinham lá ido durante a semana ver os seus filhos. Os pais de Hermione não tinham ido pois não sabiam de nada, uma vez que a professora McGonagall preferira não alertá-los. Lenny podia adivinhar que a reação de Lucius Malfoy não seria bonita quando soubesse que Draco arriscara a vida por Lenny.
-Como é que o teu pai reagiu ao saber o que fizeste? – perguntou uma terceira voz, que devia pertencer a Vincent Crabbe ou a Gregory Goyle.
-Como é que achas? – replicou Draco – mal, é claro. Anda desvairado à minha procura e a minha mãe e a McGonagall tiveram de o acalmar.
-Mas tens de ir ter com ele – fez Pansy ver. Lenny sabia que não devia estar a espiá-los, mas a curiosidade era demasiado grande.
-Eu sei, mas já sei o que me vão dizer. Até me podem tirar de Hogwarts e pôr-me em Durmstrang ou assim – a voz de Draco parecia monótona e aborrecida e Lenny susteu a respiração. Eles não podiam tirar Draco de Hogwarts! Subitamente, Lenny tropeçou no manto, escorregou para a frente, escancarou a porta do seu dormitório e caiu pelas escadas abaixo até se estatelar no chão alcatifado da sala comum dos Slytherin. Vincent, Gregory e Pansy começaram a rir-se, mas os dois primeiros calaram-se ao ver a expressão de Draco. Pansy esboçou um meio sorriso.
-A espiar as conversas dos outros, Lenny? – perguntou, desdenhosamente.
-Estás bem, Lenny? – questionou Draco, para grande fúria e descontentamento de Pansy. Lenny apenas se sentia atordoada da queda, mas estava bem. Tinha enfrentado coisas muito piores nos últimos tempos.
-Sim, eu…
-Ah-ah, então estavas a espiar! – riu Pansy.
-Não, eu não te estava a responder a ti, Pansy! – argumentou Lenny, esperando não começar a corar.
-Vou fingir que acredito – anuiu Pansy. Lenny levantou-se, rejeitando a ajuda de Draco.
-Bom, vou deixar-vos conversar à vontade – declarou ela, caminhando na direção da saída.
-Espera - pediu Draco. Lenny reparou que Pansy revirou os olhos – estás mesmo bem?
-Estou bem – respondeu Lenny num tom flácido, abrindo a porta de saída. Mas ao fazê-lo os seus olhos incidiram na única pessoa que não queria por nada ver.
Lucius Malfoy. 

Saudades

A luz invadiu-lhe a visão, sem a deixar ver nada. Sentia-se dorida, presa e cansada. Não se conseguia mexer, não conseguia encontrar a voz, mas sentia o peso do corpo, combinado com um cheiro que lhe era vagamente familiar: como lavanda e alfazema…
-E se ela não acordar? – perguntou uma voz, que naquele momento Lenny não conseguiu identificar – todos os outros já acordaram…
Onde estava Lenny? E de quem era aquela voz, tão familiar mas indistinguível?
-Não te preocupes. Ela vai ficar bem, Melanie – disse uma segunda voz, também ela soando preocupada.
Melanie.
Melanie, Melanie, Melanie.
Melanie…
Melanie…!?
Lenny sentiu a garganta presa, sufocando-a. Abriu os olhos repentinamente e ergueu-se, respirando ofegantemente.
-Lenny!
Lenny arregalou os olhos… não podia… eram… aquilo era... um sonho… Lenny sentia-se demasiado traída para voltar a cair na ilusão de que à sua frente, são e salvos, estavam mesmo os seus pais… era uma ilusão, tinha de ser… era um sonho do qual não queria acordar mas o qual podia a qualquer momento transformar-se num pesadelo…
Os pais pareceram-lhe mais vivos e nítidos do que em qualquer outra das suas ilusões… seria por estar tão perto? Depois Lenny olhou em volta… estava na Ala Hospitalar de Hogwarts! Mas como… a última coisa de que se lembrava era de ver a cara dos pais e de cair numa fusão de cor e lágrimas, grãos de areia e cristais…
Os pais sentavam-se, um de cada lado da sua cama branca, numa cadeira. Lenny olhou primeiro para a mãe. Tinha cabelo louro e olhos muito azuis. Depois olhou para o pai, Michael. Também era louro e os olhos eram azuis-mar. Melanie pegou-lhe na mão, suavemente. O seu toque fez Lenny despertar daquele estado de transe… seria mesmo possível…. estariam mesmo eles ali com ela?
-Sim, Lenny. Estamos aqui – proferiu a mãe, como se lhe tivesse lido a mente. E talvez tivesse, visto ser uma boa Legilimens. Lenny perguntou-se se já antes a mãe lhe costumava ler a mente, mas tinha quase a certeza de que Melanie não era pessoa para se intrometer na cabeça dos outros a não ser que tivesse uma razão muito forte. E teria ela, tal como Braxton, dificuldade em entrar-lhe na mente devido à capacidade de Lenny, ainda que inconsciente, de bloquear a Legilimância? – salvaste-nos.
-Não. Isto é um sonho… uma ilusão… por favor, não me iludam para depois me desiludir… não me façam isso… - pediu Lenny, com voz triste.
Melanie e Michael entreolharam-se, preocupados.
-Lenny, é a verdade. Isto é a realidade – confirmou Michael, sorrindo-lhe apaziguadoramente.
E então Lenny debruçou-se sobre eles, abraçando-os com força e suspirando ao ver-se envolvida em braços fortes e sólidos, reais, a realidade a abater-se sobre ela. Os pais estavam mesmo ali. Conseguira. Salvara-os.
-Não consigo acreditar… oh, pais! Tive tantas saudades vossas! – exclamou ela, as lágrimas a teimarem por lhe escorrerem pela cara. E depois começou a rir-se, um riso puro e genuíno, aliviado, confundido com soluços. Os pais sorriram e deixaram-na acalmar.
-Também tivemos muitas saudades tuas, Lenny - disseram ambos.
-Como é que vim aqui parar? Só me lembro de ver as vossas caras e de cair… - comentou Lenny.
-Sim – concordou Melanie - estávamos contidos nos grãos de areia da ampulheta, sabes? Uma magia ancestral fez com que nos armazenássemos naquela ampulheta desde a batalha de Hogwarts… quando aquele raio de luz verde, durante a batalha, veio de encontro a nós… eu e o teu pai vertemos lágrimas… chorámos pela tua avó, pelos nossos amigos, mas principalmente por ti, Lenny. Foi o poder do amor que nos salvou. As nossas lágrimas expressaram o nosso amor por ti e foi nos dada uma segunda oportunidade… e então vimo-nos sugados para dentro da ampulheta, sem que pudéssemos fazer alguma coisa. A princípio não percebemos o que se passara, se estávamos mortos ou não. Depois começámos a perceber que não, que ainda vivíamos e tentámos mandar-te pistas para que viesses à nossa procura. Seria perigoso, ainda para mais porque não sabíamos que já tinhas poderes – e o sorriso de Melanie alargou-se num sorriso de orgulho, bem como o de Michael – mas tínhamos de tentar, tínhamos de arriscar. E conseguiste, Lenny. Conseguiste.
-Então, não foram vocês que nos puseram todos aqueles desafios à frente? Os túneis, os medos…
-Não, Lenny. Os teus amigos já acordaram e contaram-nos o que se passou durante a vossa jornada, mas não fomos nós. Tudo o que fizemos foi ajudar-te a vires de encontro a nós. Temos muito orgulho em ti, filha – afirmou Michael.
-Onde é que eles estão? – questionou Lenny de repente – quanto tempo estive adormecida?
-Uma semana – respondeu a mãe – os primeiros a acordar foram os gémeos, depois Ginny e Ron… em seguida Hermione e Harry… - depois a sua cara contorceu-se numa expressão estranha, que Lenny não conseguia explicar – depois Draco…
-Pois, acerca desse rapaz, minha menina… – começou o pai, mas foi interrompido pelo abrir repentino das cortinas brancas que os rodeavam. Fred, George, Harry, Ron, Hermione e Ginny correram para ela.
-Finalmente! – exclamaram, abraçando-se uns aos outros. Lenny observou-os. Pareciam estar recuperados, sãos e salvos. Os seus olhos brilhavam, a cor da sua pele voltara e os arranhões curaram-se.
-Acho que é melhor deixarem a Lenny conversar com os seus pais – sugeriu Madam Pomfrey, a enfermeira.
-Até já – despediram-se eles, deixando Lenny e os pais novamente sozinhos, mas não por muito tempo, pois depressa chegou a avó de Lenny, Christine. Como se dirigiu de imediato a Lenny, esta calculou que já vira os pais e que já matara as saudades todas. Christine tinha lágrimas nos olhos.
-Lenny, quem te mandou ingressares numa jornada perigosa sem me dizeres nada? Quando a professora McGonagall me escreveu a dizer que desapareceras, não sabes a aflição com que fiquei! Vim de imediato para aqui e aqui tenho estado nas últimas semanas… e depois ouviu-se um estrondo no átrio principal e só vos vi todos, caídos no chão, pareciam mortos excetuando a Melanie e o Michael… levaram-vos para a enfermaria enquanto os teus pais nos explicavam o que se passara, do ponto de vista deles, mas quando Fred e George acordaram começaram logo a contar o que se passara e o que tinham enfrentado… e agora já toda a escola e até Hogsmeade sabem o que se passou. E eu nem conseguia acreditar que tinha a minha filha e o meu genro de volta mas que a minha netinha se encontrava em mau estado na enfermaria… estavas cheia de arranhões e cicatrizes, Lenny, nem te conseguia reconhecer… - Christine começou a chorar ruidosamente e Lenny consolou-a.
-Calma, avó. Está tudo bem, agora – depois, para aligeirar o ambiente, inquiriu – então, já puseste a conversa em dia com os meus pais?
-Já sim. Eles também estiveram a falar com diretora e com os outros professores – disse a avó, enxugando as lágrimas.
-Ficámos muito admirados quando ouvimos dizer que foste para os Slytherin. Aliás, quando te vimos com o manto dos Slytherin. Sempre pensámos que, se alguma vez fosses para Hogwarts, entrasses nos Gryffindor, como nós, ou nos Ravenclaw ou nos Hufflepuff, mas nunca nos Slytherin… - disse a mãe. Lenny baixou a cabeça, mas a mãe tocou-lhe no queixo, fazendo-a levantar-se.
-Mas isso não é motivo para te envergonhares, filha. Nem todos os Slytherins são maus – sorriu a mãe e Lenny não pôde evitar lembrar-se de todas as discussões que tivera com os amigos e com Draco sobre esse assunto. Draco… porque não fora também ele ter com ela, como os outros tinham feito? Sabia que ele já tinha acordado, mas por onde andaria?
-Que dia é hoje? – interpelou ela.
-10 de Fevereiro, Domingo. Estiveram fora duas semanas e estiveste na enfermaria mais uma semana – explicou o pai.
-Amanhã já vou às aulas – declarou Lenny – não quero estar aqui nem mais um minuto. Sinto-me recuperada. E vocês têm de voltar ao trabalho.
-Não nos queres por aqui, filha? – indagou a mãe, sorrindo.
-Não é isso, é só que…
-Nós compreendemos – riu a mãe – madame Pomfrey, a Lenny pode ir? Já parece estar bem e sei que está desejosa de ver os amigos.
Madam Pomfrey chegou e observou Lenny.
-Acho que sim. Caso te sintas mal, Lenny, vem visitar-me.
-Certo, madame Pomfrey – afirmou Lenny, levantando-se e esticando as pernas – obrigada.
Os pais e a avó levantaram-se também. Lenny voltou a abraçá-los.
-Mal posso acreditar que estão outra vez aqui comigo!
-Nós também… e em Hogwarts! – sorriu o pai – és uma feiticeira talentosa, Lenny, e não podíamos estar mais orgulhosos de ti. Agora, por certo queres ir ter com os teus colegas, não é? Nós também temos de ir falar com a diretora.
-Ok, até já – despediu-se Lenny, saindo da Ala Hospitalar. Respirou fundo. Fora difícil e fatigante, mas no fim valera a pena. E agora Lenny reconhecia finalmente o seu valor. Inspirou fundo, correndo impacientemente para ir ter com os amigos, com Shy e com Hedz.

sábado, 21 de dezembro de 2013

Não me abandones

Lenny sentiu o frio a rodeá-la e a enregelar-se no seu corpo; não se conseguia mover. Encontrava-se debaixo de uma água gelada e profunda e os seus ouvidos e nariz estavam cheios de água, impedindo-a de ouvir ou cheirar o que quer que fosse. Tinha os olhos fechados. Depois, quando os abriu a custo, sentiu-se a flutuar… a água era azul e cristalina e era tudo o que via… para quê continuar, se podia ficar ali para sempre, sem se preocupar com nada? Para quê resistir àquela imensidão pura e bela?
Resiste, Lenny… vá lá, tu consegues… por eles… por mim…
Viu-os: as imagens desfocadas a preto e branco dos seus pais na imensidão azul, mas a voz que ouviu não correspondia a nenhum deles. Soava abafada e cansada, mas alerta e preocupada ao mesmo tempo. Era grave e rouca. Draco.
E depois tomou consciência de onde estava, porque estava e de como fora ali parar. Tinha ido em busca dos pais, não podia desistir. Mas era tão fácil e tão tentador… Lenny queria lutar e sair daquele estado de transe, mas ao mesmo tempo não queria…
Por favor, Lenny… resiste… não os deixes… não me abandones, Lenny.
Sentiu os membros do seu corpo a libertarem-se, conseguindo mover-se. A pressão da água nos seus ouvidos aumentou, mas ao mesmo tempo permitiu ouvir-lhe barulhos fora de água. Conseguira. A voz de Draco chamara-a. Resistira à Maldição Imperius, mais uma vez.
Perfurou a superfície da água, respirando a custo. Não havia sinais de ninguém a não ser Draco: estava agarrado a um pedaço de neve não muito longe dali, nadando a custo, o rosto a abrir-se num pequeno sorriso ao vê-la. Não se via superfície alguma sem ser água, nenhum monte de neve onde pudessem parar para descansar. E onde estavam os outros? Lenny continuava gelada, mas obrigou-se a nadar para junto de Draco. Agarrou-se ao pedaço de neve. A mão fria de Draco envolveu a sua.
-Quem me pôs a maldição? – perguntou Lenny.
-Não sei. Não vi ninguém - respondeu Draco com sinceridade.
-Mas chamaste por mim – fez notar Lenny. Draco desviou o olhar e um leve rubor preencheu-lhe as faces. Como Draco não respondeu, Lenny questionou: - onde estão os outros?
-Só te vi a ti, Lenny. Lamento.
Continuaram a avançar por entre as águas, em silêncio. Lenny sentia um nó na garganta; não podia ser verdade que os amigos… por causa dela… ela não conseguiria viver com a culpa. E estava farta. Podiam ter passado apenas duas semanas desde que haviam saído de Hogwarts, mas pareciam dois meses… estava cansada, sonolenta, furiosa e triste.
Subitamente, o rio desembocou não numa foz mas num monte de pedra vazio, rochoso. Não se ouvia um som senão o movimento ondulante do rio. As águas pareciam desaparecer misteriosamente ao chegar ao sítio de pedra. Lenny e Draco não se moveram ao embater na pedra, ensopados e enregelados. Estenderam-se, pois, ao comprido, fechando os olhos. Uma lágrima caiu silenciosamente do olho esquerdo de Lenny, confundindo-se com a água do rio.

*

Lenny não sabia por quanto tempo dormira. Não sabia se tinha dormido sequer; era apenas um emaranhado de acontecimentos e situações assustadoras e terríveis, onde presenciara as mortes dos amigos e dos pais, de Draco, da avó… sentiu-se a abanar e acordou, ofegante, daqueles maldosos pesadelos. Abriu os olhos e viu Draco a seu lado, a comer uma sanduíche. Estendeu-lhe uma.
-Ainda bem que puseste um encantamento à prova de água na tua mala, Lenny – fez ele ver.
-Quanto tempo dormi?
-Mais de dez horas, suponho.
-Que vamos fazer agora? Estamos perdidos! E desculpa-me, Draco, desculpa-me… a culpa é toda minha, eu nunca devia… perdoa-me! – e as lágrimas começaram a escorrer-lhe pela cara sem que pudesse evitar. Draco chegou-se para ela, enxugando as que podia.
-Não chores, Lenny, por favor. A culpa não é tua. Nós tínhamos consciência do que podia vir a acontecer… arriscámo-nos por nossa própria conta e risco, Lenny, não te esqueças disso.
-Mas… - antes que Lenny pudesse continuar, sentiu-se envolvida pelos braços de Draco. Enterrou a cabeça no seu manto agora seco, molhando-o por completo.
-Então, aposto que não tiveram saudades nossas – disse uma voz. Levantaram ambos a cabeça de imediato e Lenny sentiu-se a sonhar. À sua frente, na pedra rochosa, estava Fred, que falara, acompanhado de George, Harry, Hermione, Ginny e Ron. Estavam todos ensopados e fatigados, cheios de cicatrizes, arranhões e cortes ensanguentados. Pareciam que iam cair para o lado a qualquer momento. E Lenny decidiu-se. Tinha que acabar com aquilo de uma vez por todas. Levantou-se e sacou da varinha, segura e presa na sua manga. Apontou-a à parede rochosa. 
-Afastem-se - avisou e depois proferiu - confringo! – a parede rebentou sob o olhar perplexo dos amigos. E Lenny soube, ao olhar em frente, que a sua jornada estava muito perto de chegar ao fim. 


*


Era uma sala estranha e maravilhosa: alta, em forma de abóbada, sem teto nem chão definido. Era apenas uma imensidão de cor, formas e luz: como as imagens num caleidoscópio, mas um caleidoscópio sempre em movimento. Ao centro, uma ampulheta encontrava-se caída no chão. Lenny pegou nela e viu uma mensagem inscrita.
“A única forma de superar o ódio é amando. A única forma de resistir é amando. A única forma de viver é amando. O amor é a magia mais poderosa. Mas por vezes nem ele supera a morte.”



Queria aquela mensagem dizer o que Lenny pensava que dizia? Quereria aquilo dizer que todos aqueles esforços - todos aqueles dias solitários nos túneis, todos aqueles confrontos com os diversos tipos de criaturas mágicas, com os seus maiores medos, com as suas tentações... - teria sido tudo em vão?
Lentamente, todos, excetuando Lenny, caíram no chão, impávidos e serenos. Lenny mal teve tempo de reagir: uma luz verde e potente veio de encontro a ela. Instintivamente, colocou a ampulheta à sua frente, os vidros estilhaçando-se, a areia escorrendo para o chão. Mas não foi só a areia que caiu no chão. As lágrimas verdadeiras e desesperadas de Lenny, mal tocaram o chão cheio de luz e cor daquela sala bizarra, fizeram a situação transformar-se. Das lágrimas reais e sinceras de Lenny formou-se uma poça no chão, como cristais de gelo sob o manto de luz e cor. Depois, uma explosão de cristais de todas as cores e feitios. A última coisa que viu foram os rostos dos pais, sorrindo para ela. Depois caiu com os cristais estrondosamente no chão, fechando os olhos, um último suspiro. 

sábado, 30 de novembro de 2013

Paraíso & Gelo

Mas não era um abismo. Pelo menos, não era sombrio. A luz foi a primeira coisa que notaram, quando caíram redondos no chão. Depois, sentiram relva a roçar-lhes a cara e os braços... lentamente, abriram os olhos para um espetáculo magnífico de luzes, cores, natureza e animais.


-Uau - murmuram. Lenny olhou estritamente para o cavalo-alado que lhe surgia à frente. Era branco e tinha asas compridas que refletiam a luz e faziam efeito arco-íris. Pássaros rosa voavam pelo ar. Ao longe, cavalos pastavam. 
-Porque raio viemos parar aqui? - perguntou Draco.
-Talvez esta jornada não seja apenas coisas más - replicou Hermione, os olhos brilhantes - talvez como conseguimos passar pelas tentações, agora...
-Tentações? - interrogou Ron.
-Sim - afirmou ela - não repararam no que estava escrito na porta? Porta das Tentações. Foi onde entrámos.
-Porque não avisaste logo? - resmungou Fred.
-Bem, eu... - Hermione baixou a cabeça.
-Deixem-na. Isso não interessa - não fora Lenny, Harry nem qualquer um dos que se esperava a dizê-lo. Draco dissera. Hermione olhou-o, surpreendida, mas Draco virou-se para Lenny.
-Os cavalos parecem estar a guardar qualquer coisa... olha - apontou para a esquerda, onde, à frente de algumas rochas, se via um objeto estranho: uma mistura de uma espada com uma varinha enorme, que emitia uma luz laranja. 
-Então passemos por eles - prontificou-se Fred.
-Calma - pediu Lenny. Avançou cuidadosamente em direção ao cavalo-alado. Porque seria o único que possuía asas? Talvez fosse o guardião-chefe...
-O Guardião-Alado! - exclamou Ginny de repente - li sobre ele no livro "Manual de Criaturas Mágicas Eleitas pelo Público Feminino" que me ofereceste pelo natal, Lenny - Ginny abriu a sua mala e depois de vasculhar lá dentro, retirou um livro grosso de capa roxa. Folheou-o até encontrar a página desejada - Aqui está. Os Guardiões-Alados são um tipo de cavalos-alados cuja função é proteger algo ou alguém. Estão intimamente ligados a esse objeto e só uma ligação externa muito forte os pode levar a deixar para trás esse tal objeto. Não são fáceis de domesticar, pois possuem uma natureza selvagem e um espírito forte, mas são extremamente fiéis e farão tudo o que estiver ao seu alcance para ajudarem e protegerem o seu objeto.
-As raparigas gostam realmente de coisas parvas - comentou Ron, levando em seguida com a mala de Hermione em cima.
Lenny encontrava-se a poucos metros do cavalo-alado. Os seus olhos eram escuros e fortes e difíceis de olhar, quase como se fosse fogo ou sol. 
-Não consigo olhar para os seus olhos - disse George - vocês conseguem?
-É muito difícil...
-Lenny, cuidado! - proferiu Draco. Subitamente, o cavalo-alado empinou-se e relinchou: um relincho forte e ao mesmo tempo delicado... Lenny não tirara os seus olhos dos deles e cambaleou para trás, caindo desamparada na relva do prado. Draco desembainhou a varinha e apontou-a ao guardião. Os outros cavalos relincharam e avançaram. O guardião abriu as asas para os fazer parar. Observava o que Lenny fazia. 
Esta levantou-se e disse:
-Não os ataques. Eles são como os hipogrifos, não é, Harry? Orgulhosos e sensíveis. 
-Bastante, sim - respondeu este.
Lenny avançou novamente: não sabia o que estava a fazer nem se devia avançar, mas os olhos dele... repeliam-na e ao mesmo tempo, contudo, atraíam-na. O guardião recolheu as asas e relinchou novamente. Empinou-se, abriu as asas num gesto grandioso e deixou cair as patas na relva, baixando levemente a cabeça. Depois, fez um movimento com a cabeça... deu meia volta, correu, abriu as asas e levantou voo... os restantes cavalos galoparam para longe, deixando-os sozinhos com o estranho objeto.
-Como fizeste isso? - perguntou Hermione - como o levaste a abandonar o seu precioso objeto?
Lenny não poderia explicar. Os seus olhares haviam-se juntado como um só e criado uma ligação... e Lenny sentiu que aquilo fora obra dos pais.
-Eu não... não sei. Mas não vamos perder tempo - avançou para a espada-varinha e os outros seguiram-na. Depois da desilusão da porta das tentações, estava determinada a encontrar os pais de uma vez por todas.
-Juntos? - perguntou-lhes.
-Juntos - responderam e no momento em que tocaram todos no objeto, foram sugados para um vórtice de cor, luz e magia.

*

Sentiram frio e escorregaram durante um tempo que lhes pareceu infinito. Quando finalmente pararam, viram-se encontrados numa gruta de gelo, percorrida pelo rio mais cristalino e misterioso que jamais tinham visto.


-Isto está a ficar cada vez mais estranho - observou Harry, a sua voz ecoando pelas paredes da caverna - primeiro os túneis e a nossa separação, depois o reencontro no lago, o deserto, a porta das tentações, o paraíso dos cavalos... e agora uma gruta de gelo. O que vem a seguir?
-Querem mesmo pôr-nos à prova... e está um gelo aqui - disse Ron.
-Aquele objeto que o Guardião tanto estimava era um Botão de Transporte - declarou Draco - penso que no momento em que percebeu que a Lenny o tinha percebido, a sua missão acabou. Foi por isso que se foi embora tão facilmente.
-Sabias que era um botão de transporte? - questionou Ginny.
Agora que pensava nisso... Lenny tivera essa sensação... mas fora rebaixada pelo fogo nos olhos do guardião.
-Sim, mas... o que fazemos nós aqui?
-À procura do Abominável Homem das Neves? - sorriu George e todos sorriram também.
-Cala-te, George, já tive que lutar com um yeti no túnel... - alegou Harry. Riram-se. Porém os risos depressa se desvaneceram quando a gruta começou a estremecer e uma avalanche de gelo avançou sobre eles.
-Depressa, o rio! - gritou alguém, e o último som que se ouviu foi o chapinhar da água quando perfuraram o rio gelado e puro. Depois, instalou-se o silêncio, acompanhado por montanhas de neve e gelo impenetráveis.

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Abismo Profundo & Sombrio

O vento fazia estremecer o tecido da tenda e o ruído fê-los acordar a todos. Arranjaram-se e depois reuniram-se na sala para tomar o pequeno-almoço. Fred e George abriram um bocadinho o fecho da tenda.
-Ah, malta... acho que vão querer ver isto - disse Fred.
-O que foi? - perguntou Ron e todos se aproximaram. Um a um, constataram o que os gémeos queriam dizer com aquilo. A dar lugar ao lago e à relva que o rodeavam, havia agora dunas e dunas de areia dourada e o vento revolvia a poeira, formando uma tempestade de areia. 


-Vou sair para ver o que se passa - disse George mas os outros impediram-no. Regressaram todos à mesa do pequeno-almoço.
-Isto pode ser apenas uma ilusão - afirmou Harry.
-Sim, duvido que a tenda tenha "voado" até ao deserto do Sara durante a noite, sem que tenhamos dado por nada - ironizou Ron. 
-Eu cá acho que é propositado - atirou Hermione, remexendo os cereais com a colher - a paisagem deve ser rotativa. Como se se adequasse àquilo de que precisamos, percebem? Antes precisávamos de um sítio calmo onde nos pudéssemos refrescar, acalmar e falar uns com uns outros.
-E achas que agora precisamos de um deserto com uma tempestade de areia? - interpelou-a Fred, com um sorriso de gozo na cara.
-E isto é estranho - declarou Lenny - porque haveria a jornada de ser assim, fácil? De nos ajudar? 
-Sabe-se lá - Harry encolheu os ombros.
-Lenny, a bússola! - exclamou Ginny. Lenny tirou-a de dentro da sua mala de missangas e abriu-a. A agulha girou durante algum tempo e depois parou, apontando para a porta da tenda. 
-É a única hipótese - disse George - temos de sair.
-Podemos ao menos esperar que a tempestade passe? - perguntou Draco.
-Sim, é melhor - concordaram os outros.

*

O vento parou de assobiar e de abanar o tecido da tenda por volta do meio dia. O sol fazia aquecer a tenda de tal forma que pareciam que estavam num solário ou numa sauna, mas os gémeos haviam posto leques a voar e a abanar-se continuamente, provocando uma brisa fresca dentro da tenda. Arrumaram tudo e Hermione insistiu que cada um dos rapazes levasse uma mochila com mantimentos e roupa, às quais colocou o Feitiço de Extensão Indetetável. Por fim, saíram para fora da tenda.
Se os leques voadores não os tivessem seguido e senão tivessem tanta água, teriam, provavelmente morrido de desidratação ou calor. Estavam mais de quarenta e cinco graus, à vontade, e o sol brilhava num céu límpido e sem nuvens. Não se via nada a não ser dunas e dunas de areia. A poeira já não dançava no ar e o único ruído era os passos deles na areia.
-Antes de continuarmos, quero que me ajudem a duplicar esta tenda seis vezes - comunicou Hermione - uma para cada um de nós.
-Fogo, Hermione, achas mesmo que isso é necessário? - resmungou Fred.
-Fred, queres que te relembre as condições em que vivemos nos últimos dias? Quanto a ti não sei, mas eu, se tenho a possibilidade de levar uma mini-casa dentro da minha mala, prefiro levá-la a dormir com uma manta no chão - referiu Hermione, friamente.
-Pronto, pronto - deixou-se Fred convencer. Apontaram todos a varinha à tenda e proferiram:
-Geminio!
Nesse momento, seis tendas exatamente iguais à primeira apareceram junto a esta, formando uma linha. Cada um, com a varinha, fê-las diminuir até caberem dentro das respetivas malas/mochilas. Lenny abriu novamente a bússola e juntos, seguiram pelo deserto, com os leques voadores a amenizar o calor e a refrescá-los com as leves brisas, sob um sol resplandecente e felizes acima de tudo, por estarem novamente juntos.

*

Andaram o dia todo com os leques atrás e a bebericar água constantemente. Não falavam e não faziam movimentos desnecessários, para pouparem esforço. Ao anoitecer, voltaram a montar uma das tendas (a de Hermione) e discutiram a possibilidade de, de manhã, se depararem com um cenário diferente do do deserto. 
-Só espero que seja melhor que isto - disse Ron - estou estafado.
-Esperemos - concordaram os outros e foram deitar-se cedo, cansados. 
No dia seguinte, como haviam esperado, encontraram outro cenário à sua espera. Mas não foi, de tudo aquilo que lhes passou pela cabeça, o cenário de que estavam à espera.
Havia uma única porta num meio de um jardim cheio de arbustos. Não havia flores nem árvores, apenas arbustos verdes-escuro e aquela porta metálica ao centro. Umas letras desgastadas estavam inscritas na porta e Hermione franziu o sobrolho ao tentar lê-las.
-Entramos? - questionou Fred.
-Tem de ser, não é? É a nossa única hipótese - disse Harry, vagueando o jardim com o olhar. Nada ali lhe parecia ser uma saída, à exceção da porta.
-Não precisamos de ter dúvidas. Lenny, a bússola – declarou Draco. Lenny abriu-a e todos constataram o óbvio: tinham de prosseguir pela porta.
Avançaram todos mas Lenny adiantou-se: não por querer ser a primeira a ver o que estava do lado de lá da porta, mas pelo facto de como fora ela a sujeitar os outros àquilo, queria ser ela a sujeitar-se primeiro ao perigo. Rodou a maçaneta e a porta fez um ruído metálico ao abrir-se para dentro. Uma luz branca ofuscou-os. Quando Ron, o último a entrar, fechou a porta, Fred e George soltaram um grito.
-Oh!
Era a maior quantidade de utensílios para partidas e brincadeiras mágicas que já tinham visto: duas montanhas de objetos, separadas por um caminho de cimento, erguiam-se à frente deles.
-Fred, George, temos de continuar – avisou-os Ginny, puxando Fred por um braço. Porém, os olhos deles brilhavam e dirigiu-se cada um a uma montanha e começaram a tirar e a admirar os brinquedos. Hermione murmurou qualquer coisa que soava a “implicações", mas os outros estavam demasiado assombrados com a reação dos gémeos para lhe perguntarem o que é que ela estava a dizer. Não compreendiam eles que aquilo que os levava ali era muito mais importante que aquela tralha?
-Está na hora de irmos embora – tentou Ron, puxando George, que se libertou com um safanão e olhou para Fred com um entusiasmo assustador.
-Ei, Fred, já viste o que seriam estas coisas na nossa loja? Ficaríamos ricos instantaneamente!
-É verdade, George, é verdade! – riu Fred. Draco cruzou o olhar com Lenny e esta percebeu que a paciência do rapaz chegara ao limite.
-Toca a andar – Draco agarrou Fred por um braço e Harry foi ajudá-lo. Ginny juntou-se a eles, enquanto Hermione, Lenny e Ron tentavam demolir George daquela ideia estúpida.
-Não! – berrou Fred, como se fosse uma criança mimada e birrenta, tentando agarrar tudo com as mãos.
-Já chega, a sério – disse Harry firmemente e, ao fim de cinco minutos, conseguiram arrastá-los dali para fora. Lentamente, e à medida que as duas montanhas com partidas mágicas ia ficando cada vez mais longe, o cenário começou a mudar. A luz dourada foi o que lhes saltou primeiro à vista. Lentamente, uma enchente de galeões resvalou para perto deles e desta feita, Ron guinchou que nem um louco.
-Galeões! Dinheiro! – gritou ele, pegando em tantos quanto podia com as mãos. Os outros não se mexeram, começando a perceber o que se passava ali.
-Vamos embora, Ron – afirmou Hermione.
-Não! Agarrem no que puderem! Estamos ricos! – riu ele. Draco agarrou-lhe novamente num braço e, juntamente com os outros, levou-o dali para fora. O cenário voltou a mudar: apareceu-lhes um pódio à frente e juntamente com o número um escrito a tinta preta no lugar do primeiro lugar, havia um nome: Ginny Weasley. Imagens de Quidditch, de Ginny montada na vassoura e a apanhar a snitch passavam por detrás do pódio. Ginny não hesitou e subiu para o seu lugar. Um troféu grande e dourado apareceu-lhe nas mãos e o som de aplausos surgiu como um trovão.
-Obrigada, obrigada – disse ela, sorrindo.
-Quanto mais depressa acabarmos isto, melhor – disse Lenny e os outros levaram Ginny, contra a sua vontade, de volta ao caminho a seguir.
Desta vez, foram os livros que eles avistaram e souberam instantaneamente quem seria afetado. Olharam para Hermione, de olhos esbugalhados e um sorriso tonto no rosto, que pegava já num livro de aspeto caro e antigo. Hermione tentou falar, mas parecia tão entusiasmada que não conseguiu. A reboque, lá foi ela com os outros.
Harry foi a vítima seguinte: réplicas dos pais e de todos os seus entes queridos que haviam morrido surgiram-lhe à frente, sorrindo-lhe corajosamente. Por sorte, os gémeos agarraram-no a tempo de ele ir ter com eles.
Draco foi a seguir. O seu cenário reproduziu o seu pai, sorrindo e parecendo muitos anos mais novo, acompanhado da sua mãe, também ela sorrindo e parecendo mais nova. Estes cumprimentavam uma réplica de Lenny, parecendo dar-se todos muito bem. Lenny sabia o que aquilo significava para ele, pelo que o seu ritmo cardíaco aumentou ao aperceber-se de que fora a única que ainda não tinha sido vítima de nada. Lentamente, avançaram para o cenário final.
Lenny sabia o que a esperava, mas não estava certa de que seria verdade ou não. Deparou-se com, nada mais nada menos, os pais vivos e a sorrir, olhando para ela. Mas quando os viu, tudo o resto se desvaneceu. Não queria saber se eles eram verdade ou não, apenas lhe interessava o facto de que estavam ali, vivos e com ela. Correu para eles, mas no instante em que lhes tocou, um grande buraco negro abriu-se-lhes aos pés e caíram todos para um abismo profundo e sombrio.

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Reencontro

Lenny correu desenfreadamente pelo túnel fora, o coração a querer saltar-lhe do peito. A luz tornava-se mais intensa à medida que a rapariga se aproximava. Por fim, o túnel abriu-se, expandindo-se numa paisagem rústica preenchida por um lago de água fresca e por relva à frente e atrás do lago, mas não nos lados, pelo que não havia passagem de terra entre as duas margens. Não havia ninguém.
Lenny não sabia o que pensar ou o que fazer. Podia ficar ali à espera dos amigos ou tentar procurá-los... porém o seu raciocínio foi interrompido por uma voz.
-Lenny! - esta virou-se e viu Hermione correr na sua direção, com a mala azul a tiracolo e com ar muito cansado, mas com absoluta alegria ao vê-la.
-Hermione! - correu na sua direção, abraçaram-se e ambas suspiraram de alívio ao envolver os braços nalgo sólido e não num holograma ou num fantasma, numa representação. 
-Estás bem? - questionaram ao mesmo tempo e soltaram uma pequena gargalhada. A ambas lhe doeram os músculos da cara. Não sorriam há dias e não se viam há uma semana.
-Eu por mim contava-te já tudo - disse Hermione - mas não me apetece repetir a mesma história vezes sem conta... vamos esperar pelos outros...
Um silêncio assustador tomou conta delas enquanto esperavam. Hermione tinha lavado a cara no lago e perguntava-se se seria boa ideia tomar banho no lago antes de algum dos rapazes aparecer, quando uma mancha de ruivo rompeu a superfície da água. 
-Ginny! - guinchou Hermione, debruçando-se para ajudar a amiga a sair do lago. Hermione e Lenny fizeram-na sair do lago, deitando-a na berma. Passado algum tempo, Ginny começou a falar.
-Caí num buraco, no túnel. Quando me apercebi, estava dentro de água. Estou tão contente por vos ver - sorriu ela.
Decidiram refrescar-se no lago enquanto não havia pessoas masculinas e depois vestiram roupas limpas e petiscaram, sempre sem falar do que haviam passado no túnel.
Estavam a falar dos EFBE's quando uma voz grave ressoou por detrás delas.
-Tiveram saudades minhas?
Hermione virou-se, o vento a fazer esvoaçar os seus cabelos volumosos e cor de mel e lançou-se aos braços de Ron. Este abraçou-a firmemente e quando tomaram consciência, afastaram-se, envergonhados.
-Ron - Ginny abraçou-o e Ron esboçou um sorriso. Depois Lenny fez o mesmo. Ron olhou-as.
-Vocês fazem-me parecer um mendigo. Porque é que as raparigas têm de estar sempre tão limpas? - resmungou ele e elas riram-se.
-Já só faltam quatro - afirmou Hermione enquanto preparava sandes para Ron.
George foi o seguinte a aparecer. Ouviram um estrondo e viram-no caído na relva, a poucos metros deles. Correram para lá e deram-lhe água e comida. A primeira coisa que perguntou, ao vê-los, ali, foi:
-O Fred?
-Ele vem já - sossegou-o Hermione.
-Já aqui estou - indagou outra voz e George levantou-se num ápice e abraçou fortemente o irmão gémeo. Seguiram-se mais abraços e as raparigas riram-se com a fome dos rapazes. 
O sol estava a pôr-se naquele décimo dia da jornada e foi então que Lenny os viu: Harry e Draco, do outro lado do lago, a arrastarem-se pela relva. Draco ajudava Harry a manter-se firme, com um braço pelos ombros deste último. Harry tinha os olhos fechados e os óculos tortos. Lenny e os outros não pensaram duas vezes. Saltaram para o lago e nadaram com as forças que lhes restavam, já que não havia um caminho de terra porque pudessem passar para chegar até eles. Teriam de nadar todos de volta para terra firme e Harry e Draco não o conseguiriam fazer, sozinhos, não no estado em que se encontravam.
Tinham as roupas esfarrapadas, a pele arranhada e alguns cortes sangrentos. Fred, George e Ginny ajudaram Harry a atravessar o lago enquanto Lenny, Ginny e Ron (ainda que não apetecesse muito a este último ajudar o antigo rival) acudiram a Draco. 
O sol já se havia posto quando chegaram por fim à berma do lago, dando lugar a um céu iluminado por estrelas e por uma lua quase cheia. 
Hermione tratou das feridas dos rapazes através do feitiço Reparo. Colocou os óculos de Harry direitos proferindo Oculus Reparo enquanto os outros lhes davam comida e água.
Harry abriu por fim os olhos e Draco não esperou mais e abraçou Lenny. Os abraços demoraram muito tempo. Hermione deixou escapar algumas lágrimas, mas os outros não pareceram reparar. 
-Acho melhor acamparmos aqui, por hoje - sugeriu Ginny.
-Se nos juntarmos, acho que podemos transformar uma das pedras numa tenda - propôs Hermione.
Juntos, conseguiram, e Hermione pôs-lhe o feitiço de Extensão, para que a tenda, embora tivesse um aspeto e tamanho normal por fora, por dentro, fosse uma verdadeira casa. 


Colocaram-lhes também os feitiços de proteção - Protego Totalum, Salvio Hexia e Cave Inimicum (usados para proteger a tenda), Repello Muggletum (feitiço de repelir Muggles), Muffliato (usado para não se ouvir as conversas em redor da tenda) e o feitiço de Desilusão (camuflagem).
Depois de todos se terem alimentado e comido e de os rapazes se terem banhado no lago, enquanto as raparigas dormitavam no interior da tenda (Harry, por precaução, aplicou um feitiço de proteção à volta da tenda, impedindo-as de espreitar lá para fora) reuniram-se todos e cada um contou o que vivenciara no respetivo túnel.
-Para mim, o Sem Forma foi a pior parte - disse Lenny e todos concordaram com ela, embora Hermione tivesse corado quando falou do dela, pois o seu Sem Forma era o único que não envolvia mortes de entes queridos. Os outros descansaram-na, dizendo que a conheciam. Resolveram não entrar em muitos pormenores, já que lhes era difícil a todos relembrarem-se do que haviam passado no túnel. Lenny lamentou tê-los feito passar por tal sofrimento, mas os outros mandaram-na calar.
A maioria foi deitar-se cedo. Haviam três quartos, um com dois beliches (usados por Fred, George, Ron e Harry), outro com três camas de solteiro (usado por Lenny, Hermione e Ginny) e um outro com uma cama de casal, onde dormiria Draco, já que ele preferia ficar sozinho e os outros também não tinham muita vontade de partilhar um quarto com ele.
Lenny foi lavar os dentes e quando regressou à sala da tenda, esta estava vazia. Sabia que todos já se tinham ido deitar, exceto Draco, e como ouviu barulho vindo de fora da tenda, saiu lá para fora.
Este encontrava-se sentado na relva, mirando o reflexo da lua branca nas águas calmas e escuras do lago. Draco e Harry não haviam falado de como se tinham juntado ao ponto de aparecerem juntos no lago: de facto, ninguém se lembrara de lhes perguntar. Lenny sabia que Hermione e Fred haviam encontrado o lago da mesma forma que ela: vendo uma luz ao fundo do túnel, George dera um passo e num minuto estava no túnel, no outro, caído na relva à beira do lago e que Ginny caíra num buraco e havia caído no lago.
Lenny e Draco não tinham tido grandes oportunidades para falarem, pois estavam sempre rodeados de gente, mas Lenny sentia a necessidade de falar com ele. Sentou-se a seu lado e mirou os seus reflexos na água do lago: Draco estava ainda mais pálido com a luz da lua a incidir sobre a sua pele e tinha grandes olheiras arroxeadas em volta dos olhos cinzentos.
-Está tudo bem? - perguntou ela, com voz suave.
-Não podia estar melhor. Estamos todos bem - respondeu Draco e Lenny sorriu ao aperceber-se de que Draco não se referia apenas a eles os dois.
-Foi muito nobre da tua parte teres ajudado o Harry - declarou Lenny, hesitante.
-Agora estamos quites - proferiu Draco, referindo-se aquando Harry o salvara da Sala das Necessidades, que ardia, durante a Batalha de Hogwarts.
-O que aconteceu?
-Os nossos túneis encontraram-se e houve uma avalanche. Ele ficou soterrado. Não o podia deixar ali...
-Fizeste bem.
-Ele murmurou... "Draco... obrigado". E depois chegámos ao lago.
-Sei que não o fizeste por mim, Draco, mas fico-te muito agradecida...
-Não o fiz? - interrogou ele, confuso.
-Não, Draco. Podes tentar convencer-te de que salvaste o Harry por minha causa, mas eu sei que no fundo não foi essa a verdadeira razão. Está na hora de começares a perceber que por debaixo dessa carapaça, desse escudo aparentemente inquebrável, palpita um coração bom.
-Só dizes isso para me fazer sentir melhor - argumentou Draco.
-Digo-o porque é verdade - replicou Lenny, esboçando um sorriso cuidadoso.
Draco apertou-lhe suavemente a mão, agradecido. Olharam-se durante algum tempo e depois Lenny indagou:
-É melhor descansarmos. Amanhã será um longo dia.
-Sim - concordou Draco e com isto levantaram-se e foi cada um para o seu quarto.

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

A Saída

Draco só pensava em Lenny. Talvez fosse egoísta da sua parte, talvez devesse ultrapassar as desavenças com os amigos Gryffindor de Lenny, mas se eles sobrevivessem e Lenny não... Draco nem queria pensar nisso... ele não saberia o que fazer..
Draco fora rápido a descobrir uma maneira de arranjar comida e conseguira transformar uma pedra num saco-cama. Duplicou a comida, arranjou uma mochila e pô-la às costas com os mantimentos lá dentro.
No nono dia, o túnel estava frio e silencioso: o único som era o ruído dos passos de Draco sob o chão de pedra, frio e sombrio. 
De repente, Draco pensou estar a alucinar: uma imagem desfocada e acinzentada de Lenny apareceu à sua frente: lançou-se sobre ela e viu-se a pisar um chão empedrado, diante de uma casa que tão bem conhecia.
A mansão da sua família.


Estava escuro e era quase de noite: ouviam-se corvos a grasnar e o vento soprava violentamente contra Draco. Os portões da mansão encontravam-se abertos e Draco ficou logo desconfiado. Os pais nunca se esqueciam de deixar o portão bem fechado e o rapaz perguntou-se o que fazia ali. Como é que, voltar para casa, o ia ajudar na busca dos pais de Lenny?
Avançou pelo acesso empedrado até casa, respirando o ar puro e frio, dos dois lados haviam sebes altas e bem tratadas. 
A porta de casa também se encontrava destrancada. Draco avançou cautelosamente pelo hall de entrada: ali dentro, reinava o silêncio. De repente, um homem alto e pálido apareceu à sua frente e Draco não conseguiu evitar pensar que o seu pai parecia um fantasma.
-Pai - murmurou.
-Draco - disse Lucius. Draco engoliu em seco. Não devia ter entrado em casa, devia ter encontrado uma maneira de voltar ao túnel... mas a ideia de ver alguém, de respirar ar puro era mais forte... o pai certamente lhe perguntaria porque não estava em Hogwarts.
-Eu... eu... - gaguejou ele.
-É mesmo isto que queres? - cortou o pai, a cara tão séria e fechada que parecia uma estátua.
-Hã? - estranhou Draco, cravando os olhos no chão de madeira da casa. Como poderia Lucius saber da missão, da jornada? Teria sido a diretora a contar-lhe? Mas ela não se dava com Lucius, não podia ser...além disso, Lucius era a pessoa menos indicada para saber daquilo... ele detestava os pais de Lenny e consequentemente, detestava-a também a ela...
-Perguntei-te se é mesmo isto que queres - repetiu Lucius.
-Não estou a perceber - Draco levantou a cabeça e olhou-o nos olhos. 
-Se gostas mesmo dela - explicou Lucius, um laivo de impaciência nos olhos. Odiava que o filho se fizesse de desentendido, mas este continuava estupefacto. Não estava, definitivamente, à espera que o pai começasse a falar dela.
-Bom, sim... eu... ela... ela é a tal - declarou o rapaz - eu sei que é.
Lucius suspirou, mas não parecia um suspiro de desagrado, antes de... alívio.
-Bom, antes ela que a filhinha daqueles... não interessa.
Draco teve a sensação de que Lucius falava de Lenny. Então, de quem é que ele estava a falar quando perguntara a Draco se gostava mesmo dela?
-Pai, eu amo a Lenny - alegou ele, de rompante. Lucius esbugalhou os olhos e a sua cara ficou roxa de fúria. Os olhos brilhavam de raiva.
-O quê? Mas ela não se chamava Daphne? Lenny não era a dos... dos... - Lucius não acabou a frase e Draco sentiu um baque no coração ao perceber que Lucius ficara convencido que Draco gostava de Daphne, mas este achava que trocar cartões de natal não era o suficiente para achar que alguém ama alguém... porque estava o pai convencido de que ele gostava de Daphne?
-Pai, eu amo a Lenny Gant - afirmou Draco veementemente. 
-O quê? - vociferou Lucius - a Lenny Gant? A filha dos Gant? Mas como... como é que és capaz... ela... eles...
-Se estás preocupado com o seu estatuto de sangue, ela é puro-sangue.
-Quero lá saber se ela é puro-sangue ou sangue de lama! - berrou Lucius e Draco sentiu um laivo de fúria ao ouvir o pai falar de Lenny daquela maneira - não podes ficar com ela, Draco!
-Mas porquê? - questionou este.
-Ela não é para ti. Mereces melhor, Draco - disse Lucius, a voz mais serena.
-Ela é ideal para mim! Se houvesse alguém, na nossa relação, que merecesse melhor, não era eu certamente, por tudo o que já fiz... ou melhor, me obrigaram a fazer, no passado!
A cara de Lucius ficou novamente branca como a cal e os olhos vazios. Não gostava de falar daqueles tempos sombrios.
-Onde está a mãe? - interrogou Draco repentinamente. Lucius olhou-de forma estranhíssima, como se não compreendesse o que o filho lhe perguntara.
-A... tua... mãe? - interpelou ele.
-Sim, a mãe, pai! Aconteceu-lhe alguma coisa? - Draco sentiu-se aflito.
-Draco... a tua mãe... morreu, não te lembras? Na batalha de Hogwarts, a Narcissa...
-Ok, pai, não tem graça.
-Não é para ter graça - bramou Lucius - é a verdade!
Dito isto, voltou-se e subiu as escadas de casa. Draco ficou sozinho no hall de entrada, confuso e desesperado. Aquilo era mentira. Draco sabia-o, ainda no Natal estivera com ela... que raio se passava ali? Primeiro, a proibição de Lucius relativamente a Lenny, depois a morte da mãe... o que faltava... saber que o pai, ou Lenny, também morreriam? Saber que Voldemort não fora destruído e queria encarregar Draco de mais alguma missão impossível? Nada podia ser pior, os seus maiores medos vinham agora ao de cima...
Os seus maiores medos...
-É um teste - sussurrou Draco para si mesmo - não passa de um desafio!
Abriu a porta de casa, correu pelo caminho de acesso empedrado, saiu pelos portões e pôs-se a frente destes, vislumbrando toda a mansão e os jardins adjacentes. Pegou na varinha, o vento novamente a bater-lhe na cara, os corvos a grasnar, e sibilou:
-Riddikulus!
Dali a instantes, apercebeu-se de que o vento parara e de que não ouvia um único som. Abriu um olho, depois outro, e viu-se sob as paredes do túnel frio novamente.

*

Os sentimentos de culpa, exaustão e solidão consumiam Lenny por dentro naquele décimo dia da jornada. Tinha saudades dos banquetes no Salão Nobre, da cama quentinha de dossel no dormitório, das aulas, de Hedz e de Shy... se calhar até das provocações de Pansy! Mas principalmente, saudades dos amigos... de Draco... 
Não via os amigos há uma semana, não fazia ideia de como poderiam estar. No entanto, a agulha vermelha da bússola continuava sempre a apontar em frente, por vezes para os lados quando havia uma curva...
Subitamente, o túnel desembocou em mais uma sala redonda, desta feita sem quaisquer porta ou túneis subjacentes, tirando aquele de onde Lenny havia saído, uma única sala de pedra...
-Parece que conseguiste passar pelo teu túnel - disse uma voz e Lenny viu a Esfinge que lhes lançara o desafio de passar pelos túneis a sair da parede à sua frente com uma expressão de malícia na cara. Para alguém que acabara de presenciar outra pessoa a vencer o seu desafio, parecia demasiado contente e convencida.
-Onde estão os outros? - perguntou Lenny de imediato, arrepiando-se com a gargalhada mesquinha da Esfinge.
-Os outros! - riu ela - devias sentir-te honrada, lisonjeada. Foste a única que conseguiu vencer o meu desafio...
-O quê? - a respiração de Lenny tornou-se ofegante e a culpa ameaçou afogá-la na mágoa. 
-Isso mesmo que ouviste... e como eles não conseguiram... não tens um caminho a seguir - declarou a Esfinge e Lenny virou-se, presenciando com horror o túnel de onde viera a desaparecer, sendo substituída por uma grande camada de pedra, formando uma parede.
-O que acontece agora? - lamentou-se Lenny.
-Agora... só tens uma hipótese... deixas que eu te devore.
Um novo arrepio atravessou a espinha de Lenny, mas ela pensou que era o que merecia. Tinha deixado que os amigos morressem por ela... merecia uma morte daquelas, lenta e dolorosa... mas depois apercebeu-se de que a Esfinge estava diferente. Era igual à outra Esfinge, só que não tinha penas de águia, mas de pavão. E as Esfinges tinham sempre penas de águia.
-Porque... porque tem penas de pavão? - interrogou Lenny e a Esfinge arregalou os olhos de pavor, como se Lenny tivesse descoberto um segredo terrível. 
-É apenas um adereço... - disse a Esfinge... anda, deixa o medo vencer-te...
O medo. Aquele era, sim, o seu maior medo. A dor e a culpa tornavam-se insuportáveis, mas as palavras da Esfinge, ainda que inconscientemente, haviam-lhe dado uma nova esperança.
-Não - afirmou Lenny, firmemente e pegou na varinha. Apontou-a à Esfinge e proferiu:
-Riddikulus!
Nesse instante, a Esfinge e a sala dissolveram-se e Lenny percebeu que voltara ao túnel. Sentiu-se aliviada, não só por saber que ainda havia esperança de os amigos estarem vivos, mas também porque conseguia visualizar uma luz lá mais à frente: a verdadeira saída do túnel. 

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

O Medo

Hermione martirizava-se, tudo aquilo fora feito de uma forma muito precipitada, deveriam ter parado para pensar, ter delineado um plano… e sobretudo distribuir mantimentos e mantas entre todos, para que não fosse preciso recorrer a feitiços. Já lhe haviam saído da mala três tupperwares, pelo menos, o que só a sossegou por saber que os amigos não morreriam à fome.
Instalara-se um calor insuportável no seu túnel: Hermione depositara a capa do uniforme dos Gryffindor dentro da sua mala azul, que continuava com o Feitiço de Extensão Indetetável. Porquanto mais tempo teria de deambular pelo túnel? Tinha dormido três noites sozinha, com uma manta debaixo dela que lhe provocava calor no corpo. Havia seis dias que deixara Hogwarts e três que não via os amigos.
No sétimo dia de viagem, Hermione sentiu-se desesperada: por quanto mais tempo prolongar-se-ia aquilo? Semanas? Meses? Anos…? Faltava-lhe o ar sempre que pensava nisso.
Sentiu-se tonta e enjoada, e, lentamente, sem se aperceber, caiu no chão de pedra do túnel e quando recuperou os sentidos viu-se num sítio completamente diferente.
Era uma sala de aula, com várias mesas e cadeiras ordenadas, mas Hermione não a reconheceu como sendo de Hogwarts, parecia demasiado simples. Era mais parecida com as salas de aulas dos Muggles, insípida e desguarnecida de retratos em movimento ou avisos a piscar. Hermione sentava-se numa das cadeiras com nada em cima da mesa, completamente sozinha. De repente, alguém abriu a porta e um vento frio enregelou-a. Uma pessoa alta e com mantos pretos percorreu apressadamente a sala, encostando-se ao quadro preto de ardósia, de frente para Hermione. Esta suspendeu um esgar de surpresa: a pessoa tinha o rosto deformado e desfocado, como quando alguém não queria ser identificado e o seu rosto aparecia sem forma. Trazia uma pasta de couro castanha consigo, que pousou na secretária de madeira à sua frente. Retirou vários papéis brancos e de aspeto importante, mas rabiscados com vários riscos vermelhos. A pessoa, que tinha mais forma de homem que de mulher, deixou cair as folhas na mesa de Hermione com evidente desagrado e repugnância, como se aquelas folhas fossem algo de malcheiroso e nojento.
Hermione susteu a respiração e sentiu os olhos molhados. Acabara de chumbar em todos os seus EFBE's. Em todas as folhas, a tinta vermelha, havia um círculo a rodear um enorme “T” de “Troll”. Não só não passara, como tivera a pior classificação de entre todas as possíveis.
Mas como era possível que estivesse ali, a receber os resultados dos seus EFBE’s se nem sequer os fizera, ainda? Só podia ser um equívoco, um sonho… não, um pesadelo! Que retratava justamente um dos seus maiores receios… e o rosto sem forma fixava-a, Hermione quase podia adivinha que por detrás do rosto desfocado havia uma expressão maldosa, de gozo… um rosto sem forma…
-É isso! – murmurou ela, para consigo, recuando até a porta. Abriu-a e saiu. Apenas havia um corredor comprido e branco, sem vida, que se estendia para além de onde Hermione conseguia ver. Apontou a varinha à porta e proclamou:
-Riddikulus!
Acordou com a cabeça à roda e o corpo dormente no túnel quente e solitário.


*

Harry era, provavelmente, de todos, aquele que melhor compreendia Lenny. Também ele, em tempos, detestara a ideia de colocar os amigos em perigo por sua causa. 
Apesar de ainda só ter enfrentado um desafio em concreto (o yeti de pelo branco), sabia que o túnel os punha à prova de maneira indireta. A solidão e a falta de mantimentos eram o suficiente para acabar com eles. Se não se tivessem preparado, estariam feitos. Harry, tal como Ron, lembrara-se do que Hermione lhes dissera sobre a comida, mas ao contrário deste, duplicou-a toda antes de a comer e também transformou uma pedra numa mochila, tal como George fizera. 
O oitavo dia no túnel estava a ser o pior: o calor era quase insuportável e o facto de não saber nada dos amigos afligia-o. Sem nada que o distraísse daqueles pensamentos, era fácil entrar em desespero. 
Subitamente, o túnel começou a tremer violentamente, atirando Harry de uma parede para a outra. A poeira fê-lo tossir e Harry fechou os olhos automaticamente. Porém, quando os abriu, já que parara de tremer, não se encontrava no túnel. 
A luz azulada foi o que lhe saltou primeiro à vista: depois distinguiu os contornos de pessoas com varinhas e uma grande espécie de porta, uma rocha, no centro de uma sala.


Mas não era uma porta, nem uma rocha. Era um véu e, nesse momento, o seu padrinho, Sirius, atravessava-a, a sua última gargalhada cravada no rosto. A dor invadiu-o ao mesmo tempo que questões lhe vinham à cabeça. Porque estava ele novamente no Ministério da Magia, como fizera no seu quinto ano escolar? E porque o obrigavam a reviver a morte do padrinho, que há tão pouco tempo conhecera? Mas, ao contrário do que acontecera uns anos antes, agora, não foi apenas Sirius que caiu pelo véu, desaparecendo. Lentamente, Dumbledore seguiu-se a ele, bem como Olho Louco, Hedwig, Dobby, Snape e depois Hagrid, Lenny, Fred, George, Hermione, Ron, Ginny...
As pessoas à sua volta deixaram de ter importância: aliás, o seu mundo já não fazia sentido, girava apenas, tal como a Terra, automaticamente. Mas de que servia continuar a respirar, a sentir o coração bater-lhe no peito, se todos os que amava passavam lentamente para o outro lado, para a morte, para o vazio... de onde não sairiam mais. 
E uma questão desoladora impôs-se na cabeça de Harry: teriam também os amigos chegado àquele lugar e por qualquer motivo, falecido? Não era o facto de poder ser o próximo que o horrorizava, mas sim o facto de já não ter uma razão para viver, já não haver nada que o segurasse à Terra, que segurasse o seu mundo... a gravidade morrera, para si. 
Mas apenas Sirius morrera ali, na realidade. Todos os outros haviam morrido de formas diferentes, isto, tirando aqueles que ainda viviam depois da batalha de Hogwarts, que deviam estar a viver naquele momento, não fosse aquele maldito véu... mas o que fazia Hagrid ali? Porque estavam todos a passar pelo véu? E que pessoas eram aquelas que se moviam à sua volta? Harry fez um esforço e semicerrou os olhos. Distinguiu Bellatrix Lestrange, com ar de louca, rindo-se às gargalhadas. Mas como era possível, ela morrera na batalha de Hogwarts, fora Molly, a mãe de Ron e dos outros Weasley, que a matara, Harry vira com os seus próprios olhos...
Algo não estava bem. Nada fazia sentido. No entanto, Harry sabia que o seu maior medo se erguia perante os seus olhos, sem que ele o pudesse evitar, sem que ele pudesse salvar os amigos, lutar por eles... a dor era infinita e destrutiva, Harry sabia que não conseguiria sobreviver. Não que quisesse. 
As lágrimas escorriam-lhe pela cara e jatos de luz de cores que, tal era a mágoa, ele não conseguia distinguir, passavam por cima de si e ao seu lado, mas Harry só sentia dor, desespero... medo... o seu maior medo...
E então fez-se luz. Era isso. O medo. No terceiro ano de Harry em Hogwarts, quando estudara os dementors com Lupin, este dissera-lhe que o maior medo de Harry era o próprio medo. Agora, porém, o seu medo era outro... ali estava ele, à sua frente. 
Apoiou as mãos nos joelhos, respirando ofegantemente e tentando recompor-se, evitando pensar na dor que o obrigava a dobrar-se. Pousou os dedos na varinha, apontou-a ao véu escuro e bramou:
-Riddikulus!
Foi atirado de um lado para o outro, contudo, em nada bateu. Voltou a tossir com a poeira e quando abriu os olhos, viu-se de volta ao túnel. Sentia-se cansado e ainda atordoado pelo que acabara de presenciar... mas também triunfante. Vencera o próprio medo.