sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Não me deixes

Fred tivera algumas dificuldades em transformar uma pedra numa manta e em arranjar comida, mas por fim, utilizou os mesmos métodos que o irmão gémeo, apesar de ter comido toda a comida sem a ter duplicado, de modo que agora não tinha nenhuma. 
Apesar de só terem passado dois dias desde que deixara Hogwarts, a Fred parecia-lhe uma eternidade. Tinha saudades de Lee Jordan, o seu melhor amigo sem contar com George, das partidas de Quidditch, das chasers da equipa de Quidditch dos Gryffindor, em especial de Angelina Johnson... e claro, das partidas mágicas que tanto ele como George adoravam fazer. 
O túnel estava a uma temperatura amena, nem quente nem frio, mas Fred começava a sentir-se claustrofóbico e sozinho. Devia ser por volta do meio dia, pois a temperatura pareceu aumentar significativamente e Fred deu por si a ser sugado por um buraco que se abrira mesmo à sua frente no túnel.
-Au! - gritou, enquanto embatia nalgo duro. Abriu os olhos e apalpou o chão: encontrava-se numa rua empedrada e ladeada por casas e lojas dos dois lados. À frente, o banco Gringotts, imponente e brilhante. Fred não sabia como, mas tinha ido parar a Diagon-Al. O seu instinto levou-o a percorrer as ruas desertas e assim que virou para a rua onde no verão ele e George trabalhavam na loja de Magias Mirabolantes dos Weasley, viu-a a arder. O edifício onde os gémeos guardavam a maior parte das suas partidas, um trabalho de uma vida... consumido em chamas...
-Socorro, acudam! - berrou Fred, mas Diagon-Al estava estranhamente deserta. E então, ergueu o olhar para uma das janelas e vislumbrou um pedaço de cabelo ruivo a tombar para trás.
-George! - gritou e sem pensar, entrou na casa em chamas. O calor agoniou-o, o fumo sufocou-lhe a garganta, as cinzas cegaram-lhe os olhos... mas ele tinha de continuar, não importava se teria de morrer queimado, só queria salvar o irmão... isso, claro, se não fosse demasiado tarde - aguamenti!
Um jato forte de água saiu da ponta da sua varinha e Fred apontou-o para os lados e para a frente. As prateleiras e estantes ardiam, via-se restos de pacotes chamuscados e negros no chão, fagulhas e coisas pegajosas nas paredes, a madeira a cair por trás de Fred e este abaixava-se à medida que subia as escadas em caracol da loja, rezando a Deus para que não fosse tarde demais... e de súbito viu-o, ao irmão, tombado sobre uma pilha de poções de amor, as labaredas a aproximarem-se dele. Passou o jato de água em volta dele, formando um círculo e afastando as chamas.
-George, por favor, não... não me deixes, George... - sussurrou ele, ajoelhando-se ao seu lado e tocando-lhe na face. Estava fria e Fred perguntou-se porque não teria o irmão apagado ou pelo menos afastado as chamas como Fred fizera. Talvez não tivesse a varinha consigo. Talvez não tivesse tido tempo para fazer o que quer que fosse... Fred sentiu o calor e as labaredas voltarem a avançar, mas Fred fê-las recuar novamente. Tocou no pulso do irmão e gritou de raiva. O seu coração parara. Não batia mais. Mas depois reparou na roupa que George usava... talvez fosse absurdo pensar em roupas naquele momento quando a pessoa mais preciosa que ele tinha acabara de falecer, mas foi essa mesma roupa que o deixou intrigado e o fez perceber que aquilo não fazia sentido. 
Fred lembrava-se da roupa que George usava quando o havia visto pela última vez, na sala dos túneis, onde estava a esfinge: o uniforme dos Gryffindor da escola. Agora, envergava o fato da loja das Magias Mirabolantes dos Weasley e não fazia sentido, numa missão como aquela, George ter querido vestir o fato, a não ser pelo facto do outro estar sujo... mas com um pequeno movimento da varinha isso resolvia-se...então porque optara George, que de certeza chegara ali da mesma forma que Fred, mudado de roupa?
O trabalho da sua vida estava completamente destruído... bem como a sua alma, uma metade de si havia desaparecido... o seu maior medo... mas aquele indício da roupa não deixava de lhe vir à mente, enquanto sentia a dor a consumi-lo mais que as enormes labaredas que teimavam em avançar, por mais que Fred as fizesse recuar com o feitiço aguamenti. Quis agarrar no irmão, mas ele não se desprendeu, como se estivesse colado às poções de amor nas quais jazia o seu corpo. Lentamente, recuou pelas escadas abaixo e saiu da loja, extinguindo o fogo. Lá fora, a rua continuava deserta.
-Ridikkulus! - proferiu e sentiu-se sugado, agora para cima e foi arremessado contra qualquer coisa rugosa e áspera. Percebeu que era pedra e deixou-se cair por esta abaixo, até se sentar no chão. Suspirou, as roupas chamuscadas. Reparou-as com a varinha e depois fechou os olhos, rezando com mais força do que alguma vez rezara na vida, pela segurança de George, da família, dos amigos e da loja de Magias Mirabolantes dos Weasley.

*

Ron levara imenso tempo a adormecer. Não conseguira transformar uma pedra numa manta, não se lembrava do que era preciso fazer, e o chão frio e desconfortável do túnel não o deixava dormir, e o estômago a roncar também não o ajudava. Mas, assim que acordou, lembrou-se do que Hermione uma vez lhe dissera sobre a comida e a Lei de Gamp e apressou-se a invocá-la. Com a pressa, comeu-a toda e só depois se lembrou de que a devia ter duplicado, mas sabia que quando precisasse dela a voltaria a invocar.
Caminhou durante algum tempo e de repente a luz ofuscou-o. Por cima de si, encontrava-se um buraco com um diâmetro de cindo metros e Ron só conseguia distinguir os raios solares e o verde, de árvores, talvez. Sem parar para pensar, içou-se, passou o corpo pelo buraco e abriu a boca de espanto. Preparou-se para voltar a passar pelo buraco, mas este desaparecera.
A floresta erguia-se alta, os pinheiros, as agulhas no chão, tudo muito familiar... Ron sabia que se encontrava na floresta onde, no ano passado, havia abandonado Harry e Hermione na busca das Horcruxes. Por aquela altura, já ele havia perpassado os feitiços protetores que Hermione lançara à tenda deles, pelo que agora seria impossível regressar. Mas o que fazia ele ali? Porque estava ele a reviver o passado? Sentou-se no chão, desesperado, sem saber o que fazer. De repente, ouviu gritos e estrondos e não teve outro remédio se não correr até ao local. Ali estava a tenda, sombria. Não se ouvia um único som. Ron apressou-se a abri-la. Se conseguira encontrar a tenda, era porque algo de errado se passara: os feitiços protetores tinham sido quebrados. E Ron viu porquê. Estendidos no chão da tenda, jaziam Harry e Hermione, pálidos, os membros do corpo contorcidos de uma maneira estranha, os cabelos cheios de gotas de sangue… e Ron soube que se nunca os tivesse abandonado, aquilo poderia não ter acontecido, ele poderia ter ajudado a vencer os oponentes, ou então estaria ali, deitado, junto deles...
Esqueceu-se que era o passado, que era impossível eles morrerem ali, que o futuro era diferente… ao vê-los estendidos no chão, sem vida, nada lhe fazia sentido. Sentia apenas dor, dor e fúria, ressentimento, culpa, não pelos assassinos, mas por si.
Como era possível… Ron sempre receara, temera não voltar a encontrá-los, tinha medo que os melhores amigos morressem e ele não estivesse lá, para os ajudar, para os proteger, para lutar ao lado deles… e agora ali estavam eles, mortos, e o que se limitara Ron a fazer? A fugir.
-Cobarde! – gritou ele para si mesmo, caindo no chão, pensando que não valia a pena o seu coração continuar a bater, se os deles haviam parado… e tudo por culpa de Ron, tudo… o seu maior medo… - não!
Ron arregalou os olhos… não podia ser… ou podia? Era a sua única esperança, a sua tábua de salvação. Recuou até sair da tenda, sem conseguir lançar um último olhar aos amigos. Posicionou-se à frente desta, segurou firmemente na varinha e murmurou:
-Riddikulus!
Um buraco de cinco metros de diâmetro abriu-se no chão debaixo dos pés de Ron e este deixou-se cair no chão duro e frio do túnel de pedra.

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